dois são os temas que abordarei nesta e na próxima postagem: parte 1) o poeta e a chacota: alguns exemplos selecionados do personagem-poeta sendo um divertido – e frutífero – motivo de tiração de sarro. parte 2) poesia e ilustração, cadê?: já que, coincidentemente, o último post, que trata de ‘Toda Poesia’ de Leminski, toca nesse assunto no que concerne às notáveis ausências de ‘processos dialógicos’ que tendam a correlacionar a leitura de poesia com outras artes, resultando numa tradição de leitura extremamente tradicional (e entediante, a meu ver), quero desenvolver um pouco mais essa questão.
mas primeiro o que vem primeiro. o poeta como personagem. já que todos sabemos bem o que significam as expressões ‘poeta de guardanapo’, ‘poeta de rua’, ‘poeta de boteco’, ou, para os de Curitiba, ‘poeta do largo da ordem ou da boca maldita’, fiz uma seleção de aparições de poetas e de poesia em histórias em quadrinhos. mais especificamente no formato de tiras. seja você, caro leitor, poeta ou não, considero que seja óbvio perceber a figura do poeta na sociedade atual como uma figura incômoda, deslocada, e em muitas vezes, como veremos abaixo, risível. o véu oitocentista e trágico que ainda paira sobre as cabeças dos versificadores de plantão neste século 21 se assemelha a uma maldição da qual poucos artistas puderam se livrar. o lugar na literatura reservado para a poesia – exemplo visível em qualquer visita a qualquer livraria – é ridiculamente pequeno quando comparado ao espaço de romances, best-sellers e mesmo quadrinhos, cujo mercado vive uma expansão sem precedentes. ser chamado de ‘poeta’ nos tempos de hoje é, eu acredito que exclusivamente, ser relacionado aos significados apresentados acima. a poesia imediata, a poesia do trocadilho barato, a poesia do sem-querer, a poesia ‘cometida’ e a poesia do sentimentalismo (grudento) tendem a acentuar a imagem ridicularizada do aedo contemporâneo. e pior, tendem a eclipsar os trabalhos de qualidade que eventualmente surgem.
e sob essa aura de ‘maldito’, ‘incompreendido’ ou ‘palaciano’ é que o poeta se torna um personagem cômico das construções em quadrinhos de hoje. eu não acho que sejam despropositadas ou ofensivas, mas sim bastante perspicazes em captar uma impressão que é bastante corrente e que nem sempre é tão clara aos próprios bardos imortais. sendo assim, figuras dúbias perante a percepção de uma sociedade imediatista e tecnológica que praticamente não lê poesia, vos deixo na companhia de alguns desenhistas que (nos) deram uma roupagem completamente divertida. ressaltando, claro, que esta é apenas uma seleção bastante breve de materiais aos quais eu tive acesso pela internet. dá pra ir bem longe e já foi feita muita coisa do tipo.
não hesitem em clicar nas imagens para ficar maiorzim.
começando com Laerte (http://manualdominotauro.blogspot.com) posto alguns dos melhores trabalhos que já tocaram no assunto, incluindo a história publicada em ‘Piratas do Tietê’ que traz Fernando Pessoa como personagem principal. destaco também a ‘Divina Comédia’, que é com certeza um dos melhores quadrinhos de paródia que já li:
o poeta de Angeli (http://www2.uol.com.br/angeli/), em plenos anos 1980, pasmem, namorou a Rê Bordosa por um tempo (créditos ao grande professor Álvaro Carlini pelo envio das tiras escaneadas). não sei vocês, mas eu já conheci vários desses:
Ricardo Coimbra (http://vidaeobrademimmesmo.blogspot.com) traz um poeta e uma recepção bastante contemporâneos, seja pela indumentária ou pelo resultado da performance:
e, por fim, um exemplo trazido diretamente da Marvel, na ocasião da parceria do Homem-Aranha com o Thor na luta contra os temíveis e horrissonantes Tokkots (Super-Heróis Premium: Homem-Aranha #01, publicado no Brasil pela editora Abril em 1999. perdão pelas reproduções apenas em inglês, minha revista não está ao alcance das mãos agora…). a saber, enfim, o que interessa sobre os Tokkots no momento é que eles falavam somente com rimas, o que fazia com que qualquer conversa com o Thor parecesse um papo super descolado:
com que tipo de personagem você, caro leitor, se identifica?
eu, com o Virgílio de Laerte.
no próximo post tratarei do diálogo entre a poesia e os quadrinhos em termos de adaptação, releitura e concretização da imagem sugerida pelo texto poético. como já comentei no início do post, quero discutir um pouco a respeito da completa ausência de movimento dos autores de poesia em direção ao uso do texto impresso como material estético visual (sim, a página visível como obra), bem como para material de base para ilustrações ou adaptações. (no caso, claro, falando de Poesia, já que adaptações literárias em geral já são bastante correntes no mundo dos quadrinhos). para quem se interesse pelo assunto e queira adiantar alguma leitura, já toquei nesse assunto aqui, apresentando uma adaptação em quadrinhos da Ilíada, publicada pela Marvel.
e como cereja do bolo, apresentarei a minha primeira investida nessa nova linguagem, o que representa, para mim, um ‘sopro de ar fresco’ nesse ambiente poético que pode ser, por vezes, bastante empoeirado.
excelsior!
vinicius ferreira barth
Um comentário sobre “poesia e quadrinhos (1 de 2): poetas e poesia como temática”