
Este videopoema é mais uma parceria minha com Daniel Kondo, para além de A mancha e do projeto Coestelário, ainda em movimento; é fruto da troca contínua que tem sido o convívio com Kondo, como artista e amigo. Sou um tanto avesso a explicar demais as obras, por isso gostaria apenas de avisar que os sons que acompanham o vídeo são da ave-lira ou pássaro-lira (Menura novaehollandiae), uma espécie originária da Austrália, lá conhecida como lyrebird. Esse pássaro tem uma capacidade mimética vocal impressionante, pois imita várias aves e animais do seu ambiente. Agora, em contato contínuo com o ser humano, ele imita também nossas máquinas, carros, britadeiras, serras etc., invertendo qualquer ideia de naturalidade, ou de natureza X cultura. Sobre ele, fiz um poema no meu primeiro livro, brasa enganosa, que aqui transcrevo.
SE CANTAR FOSSE O CANTO
da cotovia do
bem-
te-vi do rouxinol
se os ruídos da codorna
do jacu das águas
que murmuram de tédio
por entre as árvores
se o próprio som sentido
das árvores do ninho
que nas árvores
se aninha
se o canto que ali se encontra
fosse caso concreto
de imitação
de tudo quanto cerca
um canto além do canto
engloba o através
da mata que deixou
aquela moto o ronco comburente
do caminhão de transportes
& por fim
o canto elétrico
que anulou seu ninho
o próprio canto-serra
sem conto sem pranto
da inaudita
motosserra
que encontrasse ninho
na garganta do japiim
na voz deste pássaro-lira
O movimento de agora não tem pretensão de comentar o pássaro e a ironia de ter esse epíteto de lira, mas de retomá-lo como voz exilada e criativa. Segue abaixo o vídeo com o link
Guilherme Gontijo Flores
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