Cecília Floresta

Cecilia_Floresta

Nascida e criada na capital paulista, Cecília Floresta tem 27 anos, graduação em Letras e ganha a vida editando livros. Não vive sem amores, literaturas (com apreço especial à brasileirada contemporânea), cinema, plásticas, dramaturgias & bares do centro de São Paulo. Escreve torto, faz rimas pobrezinhas, poemas sem métrica & desconversa no blog: https://desconversasafins.wordpress.com/.

 

idade da pedra

a mulher que caminha na pedra
carrega muito mais que peso
enfrenta desafios
cidades esquinas
asfaltos & chãos de terra batida

a mulher que caminha
sai à procura da comida
que os seios pros filhos seus
não pôde dar sem luta

caminha no silêncio da pedra
a mulher que desconfia & grita
sem nem conhecer o porquê
de tamanho silêncio
ou a qualidade robusta
que lhe saltam aos olhos
em dias ou não de chuva

a mulher que pela pedra caminha
não se lasca com qualquer parede:
avança vozeia & grita
pelo alimento necessário das crias
que ardem de fome à revelia

a mulher de pedra caminha
afronta protesta & uiva
tem pelos longos cabelos
desgrenhados poréns
valiosas dúvidas
& dívidas muitas dívidas
que jamais foram suas

 

moça entendida não paga

encarnados morangos
laranjas suculentas cortadas ao meio
pêssegos elegantes
cupuaçus babaçus
a castanha do caju
o útero ovalado do abacate
a semente espinhosa do pequi
o lado de dentro do tomate italiano
quando retiradas todas as sementes
a pele delicada da tangerina
ou a imponência sisuda do figo
o oco do melão
a vermelhidão interna da romã
a pecaminosidade bíblica
da popular maçã
& graviolas

e ela ainda me pergunta
em qual das pontas
fica o melhor pastel da feira

 

amazona das sete lanças

naquela noite
Mariana atravessou a mesa
me beijou e disse:
vai, Cecília! ser fancha na vida.

a sociedade coíbe mulheres
que amam outras mulheres.
aquela noite talvez fosse tarde,
não houvesse tantas cervejas.

minha cabeça vertiginosa cheia de imagens:
meninas verdes púrpuras vermelhas.
pra que tantas lesbianas, minha Deusa?
resmunga meu coração.
embora as minhas vontades
sejam bastantes & famintas.

a moça de cabelos curtos
do outro lado do vagão
não deixa dúvidas:
gesticula em demasia
teve muitas, muitas amantes
a mulher atrás do livro
No bosque da noite

Afrodite,
por que foi que dividiste?
se sabias que amava demais
se atinavas que não beberia
apenas uma rodada por vez

comprida rua Augusta,
se eu soltasse um “no me gusta”
seria uma rima, e não sapatão.
comprida rua Augusta
da Paulista até o centro
foste muitas vezes
minha única consolação.

eu não devia dizer nada
mas aquela mulher
mas esse tesão
botam a gente chuvosa
como Angêla RoRo nos ouvidos
em domingos
quando é tudo
quase tudo por um triz

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