4 poemas inéditos de Carla Diacov

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Carla Diacov (São Bernardo do Campo, SP, Brasil, 1975), formada em Teatro. Estreia em livro, além da participação em algumas antologias, com Amanhã Alguém Morre no Samba, (Douda Correria, Portugal, 2015). Tem participação em diversas revistas on-line e impressas.

Se atraca com as plásticas o tempo inteiro, movimento que a serve a construir em conjunto de matérias ou que a traz de volta às letras somando algo da extração da borracha. Gosta de abordar o sangue. Tende a ser serial.

Em Agosto de 2016, publicou A metáfora mais Gentil do Mundo Gentil, (Macondo Edições, Juiz de fora).

Em 22 de Setembro, foi publicado o primeiro volume de Ninguém Vai Poder Dizer Que Eu Não Disse (Douda Correria, Portugal, 2016).

Em 2017 lança mais dois livros de poesia.

* * *

cartão chinês

uma chuva que vai e que volta
uma que só volta
não é de procurar
entende-se aos poros
estende-se aos povos
ao indivíduo ou
seja a montanha
ou seja um quadrúpede nela
é o momento do grito e do labirinto
é o momento do papel estendido à tinta
momento do homem que lê e da árvore que
estica o galho na direção proposta antes bem
antes do homem
uma chuva que leva
uma que deixa eu não
eu nunca eu um quadrúpede e três trovões

esganadura

com a escuridão entre os dedões
dos pés
sentiu pela primeira vez
comunhão com o mundo
fez questão
ali mesmo
com escuridão entre os dedões
oblíqua questão de ser
um corpo
apesar da comunhão
um corpo com um pássaro atravessado
da ideia pássaro e da
religião pássaro
apesar de ser
envergadura
fez assim
asas com as mãos
pássaro sob os dedões
fome sede tonalidades fome e sede

§

coração

eu inventei que era chá
inventei que era uma raiz que
nasce só lá na Índia
nasce só e sozinha
uma por ano
dizem
inventei que dizem que
olho muito pequeno é sangue
muito engrossado nas partes íntimas
invento para amanhã que
será chuva junto das
montanhas na Índia
lá em
bem perto da
raiz só
invento que espirro
é ultimato pra libélula de
coração negligenciado
agora invento que não você
sabe que as libélulas quando pro
criam formam um hexágono exatamente irregular?

§

boeuf bourguignon

com a DENTADURA PERFEITA da Angélica Freitas
mordendo meus miolos

escolho falar com você carne
de segunda
pretendida talhada martelada de segunda
não vamos falar de amor e nem vamos
trincar sobre o ódio
quero contar meus medos
carne quase mignon meus medos
a coleção só faz aumentar
imagino que com você é o mesmo
disso a escolha
a carne de segunda deve de
quase meiga por pouco mais dava pra encantadora
decidi por ter medo de colocar muitas
unhas na fala
imaginava e agora sei chicha de segunda
vejo sua retração
sua retração concorda comigo com
o medo das unhas na fala
e a carne de segunda é amaciada
soca-se uns alhos pelas retrações
ervas vinho barato libertinagem então fogo
o assado está como nunca
como nunca fica um assado como nunca
cheiroso enganado e fatiado
imediatamente partimos para
discussões de primeira

§

horas bolas

o menino ganha uma bola
e não sabe o que fez para ganhar
tamanho mistério
em seus 15 meses de vida nunca viu
tamanho exemplo
nos desafiamos como nos amamos tudo
junto empilhado alternando o cume
a menina desvenda a bola
por isso ganha um vestido de bolas
em seus 39 meses a menina caberá no vestido
em seus 93 meses recortará as bolas
em seus 203 meses vai fazer do vestido uma bolsa
onde tudo tudo tudo cai bem com gás de pimenta
o menino repetirá para o resto da vida
NINGUÉM ME DÁ BOLA
o menino repetirá tamanho exemplo

Um comentário sobre “4 poemas inéditos de Carla Diacov

  1. a Carla Diacov é atemporal, passa água oxigenada nos ouvidos para não deixar fofocas entrarem com as bolinhas, salva Carla, Ana F. Baunilha e a MARAVILHOSA Liria Porto!

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