Ginsberg: Rain-wet asphalt heat, garbage curbed cans overflowing

Autor dos célebres Uivo e Kaddish, acredito que Allen Ginsberg (1926 – 1997) dispense maiores introduções. O poema que apresento em tradução abaixo, no entanto, é um pouco posterior e proveniente do The Fall of America: Poems of These States, de 1973. Eu, particularmente, gosto dele como maneira de ilustrar, rapidamente num poema relativamente curto, a mistura de tons, entre o profético, místico-delirante e o baixo, tanto no condizente ao banal quanto ao baixo de baixo-calão mesmo, predominantes na obra do poeta. Mesmo em solo tupiniquim, os ecos dessa voz não são difíceis de se encontrar, especialmente quando se lê, por exemplo, a obra de Roberto Piva, cuja re-leitura recente me motivou também a reler Ginsberg.

Calor do asfalto molhado de chuva, latas na sarjeta de lixo transbordando

Eu joguei os colchões sem vida nas pilhas de refugo da calçada,
tapetes velhos pisados da Paterson para a Lower East Side cheios de percevejo,
travesseiros cinza, sofás resguardados da rua de volta à rua
– saída, para ouvir Conto de assassinato, ciclistas da 3rd Street atacados esta noite –
Quicando na chuva, o Caos caído sobre telhados da Cidade,
sudários de vapor químico à deriva sobre o topo dos prédios –
Pegue o Times, Nixon diz paz refletido na Lua,
mas à noite toda não achei rapaz ninguém com quem dormir nas calçadas 3 da manhã em casa na garoa suada –
Esses colchões encharcados sobre cinco cheias lixeiras –
Barbara, Maretta, Peter Steven Rosebud dormiram nesses Travesseiros anos atrás,
nomes esquecidos, também fizeram amor comigo, fiquei com esses colchões quatro anos no meu chão –
Gerard, Jimmy, muitos meses, mesmo o Gordon loiro depois,
Paul com o grande belo caralho, o adolescente que morava na Pensilvânia,
número esquecidos, amores e amantes jovens de sonhos, barrigas terrestres –
muitos jovens fortes de olhos fechados, gozando com um suspiro e me ajudando a gozar –
Desejos já esquecidos, pessoas suaves usadas e com um beijo despachadas
e todas as vezes que gozei sozinho no escuro sonhando com Neal ou Billy Budd
anjos de meia-vida sem nome – coração batendo & olhos em pranto por amáveis fantasmas –
Voltando do Gem Spa, no corredor, um olhar de relance pra trás
e um adeus súbito à pilha de colchões infestados de percevejo encharcados na chuva escura.

(tradução de Adriano Scandolara)

Rain-wet asphalt heat, garbage curbed cans overflowing

I hauled down lifeless mattresses to sidewalk refuse-piles,
old rugs stept on from Paterson to Lower East Side filled with bed-bugs,
grey pillows, couch seats treasured from the street laid back on the street
– out, to hear Murder-tale, 3rd Street cyclists attacked tonite –
Bopping along in rain, Chaos fallen over City roofs,
shrouds of chemical vapour drifting over building-tops –
Get the Times, Nixon says peace reflected from the Moon,
but I found no boy body to sleep with all night on pavements 3 AM home in sweating drizzle –
Those mattresses soggy lying in full five garbagepails –
Barbara, Maretta, Peter Steven Rosebud slept on these Pillows years ago,
forgotten names, also made love to me, I had these mattresses four years on my floor –
Gerard, Jimmy many months, even blond Gordon later,
Paul with the beautiful big cock, that teenage boy that lived in Pennsylvania,
forgotten numbers, young dream loves and lovers, earthly bellies –
many strong youths with eyes closed, come sighing and helping me come –
Desires already forgotten, tender persons used and kissed goodbye
and all the times I came to myself alone in the dark dreaming of Neal or Billy Budd
nameless angels of half-life – heart beating & eyes weeping for lovely phantoms –
Back from the Gem Spa, into the hallway, a glance behind
and sudden farewell to the bedbug-ridden mattresses piled soggy in dark rain.

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